sexta-feira, 23 de julho de 2010

Telefonemas


Quando você me ligou naquela manhã, o ar estava pesado e o céu sem nuvens não estava tão claro, apesar do sol do meio dia. Estranhei falar contigo tão cedo num sábado, mas sua voz era sempre tão bem-vinda que decidi atender. Você sempre gostou do modo como eu esperava um silêncio para poder questionar, sempre adorou meu tom de voz rouco quando eu estava com sono. Sempre admirou minha cabeça tão adulta mesmo eu sendo tão pequena. E eu me lembro de já termos falado sobre isso: sobre como eu era perfeita pra você, feita pra você; sobre como eu deveria ser sua.
Mas não, naquela manhã você só queria me contar sobre seu novo caso. Eu não deveria ficar surpresa, sempre soube que você não era pra uma pessoa só. Mas então por que eu tinha desejado tanto que não fosse de mais ninguém?
Lembro-me da sua voz meio rouca, sempre esperando para que eu dissesse algo. Eu fiquei em silêncio. Não porque me faltassem palavras, eu tinha decorado o texto, sabia minhas falas. Eu queria dizer o quando eu te amava e eu que poderia te fazer feliz do modo que você sempre me disse que queria ser. Mas tudo que eu falei foram algumas lágrimas mudas.
A rua de casa parecia imensa e eu precisava do meu quarto. Sua voz parecia tão feliz, tão distante. Confesso ter sentido medo, receio, saudade. E foi instantâneo, não me culpe. Tentei me distrair, passei para comprar alguma coisa qualquer, consegui forçar alguns sorrisos para todos aqueles que me olharam com curiosidade.
Demorei, mas aceitei e tentei esquecer. Bom, eu apenas tentei. Eu ainda queria sentir suas mãos nas minhas, seu sorriso sempre tão reconfortante. Mas aí você me ligou de novo e eu não quis atender. Eu não poderia deixar que tudo fosse por água baixo. Um toque, dois, dez.
Atendi e, ao contrário do que tinha fantasiado, você não estava do outro lado da linha me implorando para que eu esquecesse as últimas semanas. Você apenas sentia saudade da minha voz, das minhas pausas, das minhas opiniões, da sua amiga. Da sua amiga? Então era só isso que eu era? A amiga, aquela que, às vezes, você gostava de fazer juras de amor, apenas por diversão. E só então eu entendi o meu papel na sua vida. A minha personagem secundária, com chance nenhuma de se tornar protagonista, vilã ou qualquer outra coisa com mais destaque.
E eu entedi que, por mais que eu me esforçasse, eu jamais seria a sua menina. Eu jamais seria o seu caso, o seu romance, o seu amor. Eu entendi que tudo que eu sentia se opunha ao que eu deveria sentir. E então eu desliguei, segui minha vida e desejei ser alguma outra pessoa qualquer. Alguém descartável o suficiente para ser sua paixão, uma dessas paixões de uma noite que só você sabe ter.

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